Na obra de Josi Anne Paz, intitulada “AIDS anunciada”, a autora analisa as maneiras como o veículo publicidade, que flerta com o ambíguo, com o poético e os falseamentos da imagem e da arte passa a anunciar e veicular discursos sobre a doença. A publicidade tornou-se uma das marcas da sociedade de consumidores e uma das faces mais visíveis do consumismo, incentivadora da felicidade comprada e da compra, do prazer não só em possuir, mas possuir e descartar para possuir de novo. Então, eis que surgem as campanhas sobre a Aids. Onde era pregada a liberdade absoluta de possuir, de se satisfazer, de prazer e de delírio, de repente, pede para que se tenha sobriedade.
Anne Paz aponta que mesmo negando a si mesma, como no caso das propagandas de cigarro, onde se alerta para a sedução dos anúncios, a publicidade mantém sua estetização e dessa forma sua ética fundamental, relacionada com o “vender” e suas táticas. Essas táticas incluem, por exemplo, o humor, tendência da publicidade na década de noventa e incluída nas campanhas do Ministério da Saúde. Daí Anne Paz dizer que a Aids não é anunciável, “não cabem em um briefing”, que é mais complexa.
Na obra de Anne Paz há referência à obra de Jean Baudrillard, onde este coloca o público indiferente e fadigado diante dos anúncios, daí Paz apontar que os anúncios de produtos se equivaleriam aos das campanhas da Aids. Também dele Paz cita “A sexualidade como doença transmissível”, onde a banalização da sexualidade teria levado a uma indiferença em relação ao próximo, e a Aids seria um sintoma (vias obscuras) dessa desafeição sexual e indiferença em relação ao outro: “os sexos não se tocam mais, não roçam mais, não buscam seduzir-se” (Baudrillard).
Para não deixar o post extenso, e os leitores cansados (se já não estiverem), finalizo com duas provocações fundadas em dois autores utilizados por Paz: Michel Foucault e Jean Baudrillard.
A primeira é o controle da Aids como controle do corpo. A veiculação constante, essa necessidade de permanente exposição na mídia, pode ser entendida como uma espécie de panoptismo, ao modo descrito por Michel Foucault em “Vigiar e Punir”, uma forma de disciplinar e docilizar corpos. Ao veicular constantemente os anúncios espera-se que o indivíduo interiorize a mensagem, aja de acordo com o que é prescrito e que passe inclusive a vigiar a si próprio, em casos de ter apresentado comportamento de risco. Desse modo “inscreve em si a relação de poder na qual desempenha simultaneamente os dois papéis; torna-se o princípio de sua própria sujeição”. O que vemos é que a Aids se torna como diz Antônio Fausto Neto em “Comunicação e Mídia impressa” um fenômeno além do biológico, passa a ser um fenômeno discursivo de onde emana uma pluralidade de discursos institucionais. Como diz Foucault “a relação de cada um com sua doença e sua morte passa pelas instâncias do poder, pelo registro que delas é feito, pelas decisões que elas tomam”.
A segunda é a interdição da morte pelo estado. A interdição da morte é a proibição de morrer. Jean Baudrillard discorre sobre essa interdição na obra “A troca simbólica e a morte”, e aponta o controle da morte dos sujeitos como fonte de poder. A morte passa a ser anormal, já que passa a ser computada como capital de vida, e se necessita de um acúmulo progressivo. O próprio fato de o doente ser levado ao hospital para morrer, de não compartilhar sua morte, a torna um escândalo, e como diz Baudrillard, pornográfica. Dessa forma a vida é encarada como que em um contrato, onde esperaríamos o cumprimento de todo o percurso “normal” e que qualquer desvio seria uma sabotagem. A proibição por parte do estado da morte se dá pela necessidade do trabalho (lucro). Por isso a necessidade da proteção; A proteção (segurança) seria como o celofane por cima do bife: “cercar-nos de um sarcófago para impedir-nos de morrer”. Por isso as campanhas contra acidentes, epidemias, etc. apresentam resultados insatisfatórios. Os indivíduos se vêem privados de sua própria morte, de sua responsabilidade, e agiriam por instinto de preservação, desobedecendo às ordens que recebe sobre como conduzir sua própria existência e reagindo a obrigação de continuar vivo.
Acho muito importante, pessoas como Anne Paz trazer para dentros dos estudos a forma como a aids vem sendo tratada pela mídia e enxergada pelas pessoas. Infelizmente somos uma minoria que temos acesso a este estudo, mas quebrar barreiras e enfrentar normas da sociedade é um dos objetivos da geração de hoje.
ResponderExcluirnão discordo que possam existir inúmeras intenções por trás das campanhas governamentais para o uso de camisinha, para fazer o teste do HIV, para se proteger, para não beber e dirigir, etc. mas acho que a maior e principal dicussão nao deve ser se o governo faz isso porque quer "salvar as pessoas" ou porque quer "aumentar a força de trabalho".
ResponderExcluiras doenças sexualmente trassmissíveis são perigosas, e a AIDS é a principal delas, já que não tem cura e o tratamento é caro e nocivo. é importante sim fazer campanhas, quaisquer que sejam os motivos de quem as faz. não vejo sentido em ficar discutindo se o governo deve ou não fazer este ou aquele tipo de propagada.
para mim, o que deve ser discutido é se essas campanhas são eficazes e, se não são, como mudá-las. nós temos sim direitos sobre nossas próprias vidas, e nossas próprias mortes, mas não temos direitos sobre as vidas e mortes alheias. e quando deixamos de usar camisinha, quando dirigimos alcoolizados, etc, estamos colocando várias vidas em risco. até mesmo vidas de quem não quer morrer tão cedo.
No texto de Anne Paz o que mais me chamou atenção mesmo foi o PODER que a publicidade exerce no sujeito social. Como não sou da comunicação não tinha muita idéia de como isso funcionava.
ResponderExcluirÉ muito interessante ver a relação do Estado com a sociedade por vias midiáticas publicitárias.
ResponderExcluirAs propagandas publicitárias mostram que a aids tem que ser combatida pela população através dos controle do corpo de cada indivíduo e vendem a ideia da necessidade, algo que tem que ser almejado por todos se quiser ter uma vida SAUDÁVEL e FELIZ por não ter a dor de uma doença sexualmente transmissível sem cura.
Ok, se realmente é para a saúde e felicidade da nação por que não se faz uma campanha contra a obesidade e, consequentemente, os alimentos que a provocam? Segundo a Organização Mundial de Saúde, a obesidade é uma doença considerada como a epidemia global do século XXI devido ao grande número de indivíduos obesos.
Obesidade, segundo estudos estadunidenses, aumenta até 12 vezes o risco de morte. No Brasil, 70 milhões de brasileiros estão acima do peso (40% da população), destes, 18 milhões são obesos.
A obesidade é considerada como a segunda causa de morte passível de prevenção. Mas aí, o governo dá preferência substancial para publicidades de prevenção contra a aids.
O mercado da obesidade é lucrativo, impostos de tantas empresas, movimenta-se muito capital com a Coca-Cola e McDonald's, por exemplo.
A aids se desse grana para o governo quem sabe... né?
Pra mim, é bem claro que o governo faz campanha contra a Aids pelo mesmo motivo que faz campanha contra qualquer outra doença que possa virar epidemia: é mais barato do que o que o Estado gasta no tratamento das doenças. Ainda mais porque a Aids não tem cura e então o tratamento é necessário "pra sempre".
ResponderExcluirConcordo exatamente com a opinião da Bárbara. Não importa o por que das campanhas. O governo, assim como todo mundo, faz as coisas com algum interesse mesmo. E não há problema nisso. As campanhas são sim importantes e necessárias.
A discussão talvez, a crítica ao governo, devesse ser sobre o por que de essas campanhas não serem feitas cosntantemente. Carnaval não é o único período do ano em que as pessoas fazem sexo sem camisinha. Não mesmo. As campanhas tem que acontecer o ano todo. E pronto!
Muito bom autores como Paz tratar a questão da subordinação do tema 'Aids' aos interesses do governo. O discurso utilizado nas campanhas deixa de ser 'social' e submete-se ao discurso publicitário. A Aids passa a ser tratada como um produto para qualquer agência elaborar um briefing e planejar uma campanha.
ResponderExcluirAproveitando o que foi dito pela Juliana, continuo a dizer que o que o Estado faz ao veicular 'informações' a respeito da Aids por exemplo, é não deixar espaço para que a sociedade o questione por não está fazendo nada em prol de um problema social. Ele não se importa com o que vai ser informado, se o que vai ser divulgado vai ser educativo ou não, ele só se importa em mostrar serviço, independente da qualidade deste.
ResponderExcluirA AIDS deve ser tratada pela publicidade com caráter educativo e informativo.
ResponderExcluirComo na foto do texto, a maioria das campanhas publicitárias utilizam o sexo como única forma de ser transmitida essa doença.
O Governo deve utilizar a publicidade e suas estratégias para informar de maneira correta sobre todas as formas de se prevenir.
O que me chamou mais atenção, como já foi dito, foi a forma como Josi Anne Paz abordou o tema da publicidade voltada a AIDS. A discussão sobre a inteção do estado em faze-las, e a forma como sao feitas, tambem são válidas, mas secundárias, uma vez que como todos sabemos, a AIDS é sim uma grande ameaça a "saúde social", e suas consequências são refletidas em todos os setores da sociedade, direta ou indiretamente. Portanto, mesmo que com segundas intenções, essa publicidade deve continuar.
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